Após outras tentativas, a indústria vive atualmente uma nova onda de empolgação com a realidade mista. De sigla MR (mixed reality) ou XR (eXtended reality), variando de acordo com as fabricantes, essa tecnologia mistura elementos virtuais no mundo real com momentos de imersão total e ainda é pouco acessível em preço, mas ainda demonstra potencial.
Além de headsets como o Apple Vision Pro, que não empolgou o mercado, modelos como o Meta Quest e o PlayStation VR2 trazem novos ares para essa experiência imersiva de navegação, comunicação ou jogos. Há ainda uma futura tentativa da Google e óculos inteligentes mais simples, como os Ray-Ban da Meta.
Antes deles, entretanto, a Microsoft fez parte desse mercado com um produto considerado promissor em vários setores, da indústria ao entretenimento. O HoloLens foi um dos projetos mais ousados da dona do Windows, mas a cada ano parecia ficar cada vez mais discreto até hoje mal ser lembrado mesmo pelos grandes fãs da marca.
Uma nova realidade para a Microsoft
O ano de 2016 foi visto pela indústria como um possível ponto de virada para a Realidade Virtual (VR) e a Realidade (Aumentada), com o lançamento de novos headsets e a disponibilização de conteúdos com suporte a esses formatos. O Oculus Rift, que começou essa nova onda, com o HTC Vive e o primeiro PlayStation VR também encabeçando essa empolgação.
Só que havia outro produto em desenvolvimento ainda mais ousado e promissor: o HoloLens da Microsoft, internamente chamado de Project Baraboo. Planejado ao menos desde 2012, ele tinha como líder de projeto Alex Kipman, brasileiro veterano da Microsoft que supervisionou também a criação da plataforma de controle por movimento do Xbox, o Kinect.
A revelação do HoloLens aconteceu um ano antes, em abril de 2015, durante a conferência Microsoft Build. No palco, mostrando o produto de surpresa e sem qualquer vazamento prévio, ele roubou a cena ao exibir um headset imersivo cheio de aplicações possíveis e com um uso aparentemente bastante intuitivo.
A ideia do dispositivo de realidade mista era projetar nos visores na altura dos olhos do usuário elementos virtuais interativos — como blocos de Minecraft, um esqueleto humano em dimensões reais ou versões tamanho família de peças minúsculas de um automóvel.
Meses depois, a Microsoft fez demonstrações controladas do HoloLens ainda em fase de protótipo e os relatos eram os mais positivos possíveis. O dispositivo foi testado por arquitetos, estudantes, programadores e elogiado amplamente por todos, o que só aumentou a expectativa sobre o produto.
O HoloLens encara o mercado
Passada a empolgação, em março de 2016 o HoloLens foi oficialmente disponibilizado, ainda que de forma limitada. A edição de desenvolvedores, lançada antes para ser possível criar apps e experiências para o produto, entrou em pré-venda por US$ 3 mil (aproximadamente R$ 11 mil na conversão da época).
A própria Microsoft confirmou que, inicialmente, o público do HoloLens seria o empresarial — ao contrário dos demais headsets da época, voltados o consumidor padrão. Ainda assim, ela parecia apostar alto no sucesso da empreitada
A primeira geração do HoloLens rodava a partir do chip Intel Atom x5-Z8100 e uma unidade de processamento própria da Microsoft, trazendo uma tela de 2,3 MP de resolução. Ele era composto por quatro sensores e uma câmera de profundidade para captar imagens do ambiente e permitir a inclusão de elementos virtuais na tela.
O headset é colocado junto com uma faixa na nuca, com tamanho ajustável para deixá-lo fixo na cabeça. Nas laterais, alto-falantes com som espacial ajudam na imersão a partir do áudio. Já a bateria durava ao máximo três horas de uso, mas era possível usar o aparelho com cabos. O sistema operacional era o Windows 10, porém em uma versão modificada chamada de Windows Mixed Reality.
Ainda em 2016, a Microsoft expande pré-venda para mais países. Já no ano seguinte sai a versão comercial, que passa a custar US$ 5 mil. Nesse período, o dispositivo é criticado por limitações técnicas de hardware que não eram aparentes nas demonstrações.
Outra crítica surgiu em 2018, quando a Microsoft assinou um contrato com o exército dos Estados Unidos para fornecer os headsets para soldados, que usariam o display para missões de combate e treinamento. Até mesmo funcionários se manifestaram contra o acordo para fins militares em uma carta, mas ele foi oficializado.
A segunda e última geração
Para resolver ao menos as questões envolvendo o hardware, a Microsoft revelou em fevereiro de 2019 o HoloLens 2. A segunda geração era bem mais poderosa, mais confortável para longas sessões de uso e prometia uma imersão ainda maior.
O headset trouxe maior campo de visão, controles intuitivos nos botões físicos do headset, lentes de resolução 2K e câmeras melhores.
O dispositivo foi vendido oficialmente por US$ 3,5 mil (R$ 14,3 mil em conversão direta da época) a partir de novembro, mas chegava a custar até R$ 50 mil no Brasil. Nesse período, porém, a onda de 2016 envolvendo essa tecnologia já tinha ficado para trás e ele foi disponibilizado em quantidades limitadas.
Com o passar dos anos, a própria Microsoft parece ter dedicado cada vez menos espaço ao projeto. Alex Kipman deixou a empresa em 2022 após acusações de comportamento inadequado, parte da equipe foi cortada no ano seguinte em layoffs e outros produtos foram colocados como prioridade, como a divisão Xbox e a inteligência artificial Copilot.
O fim da linha do HoloLens foi decretado em outubro de 2024, quando a Microsoft comunicou o encerramento da produção da segunda geração e não ter planos para lançar um substituto. O suporte oficial vai até 2027 e as vendas seguiram até o fim do estoque.
O HoloLens deu errado?
O HoloLens não foi um fenômeno comercial e muito menos cumpriu toda a revolução prometida pela Microsoft. Em um nicho pontual, ele foi usado com sucesso em cirurgias ao redor do mundo, inclusive no Brasil e também para fins educativos em áreas como engenharias e na saúde.
Além disso, indústrias e profissionais de design chegaram a encontrar formas de aproveitar a Realidade Aumentada no ambiente de trabalho. O headset segue também como um equipamento militar, por mais controverso que seja o uso dele nesse meio.
Apesar de hoje ser considerado um projeto encerrado, o HoloLens ajudou a posicionar headsets de realidade mista como uma tecnologia educacional e empresarial. Na próxima onda dessa indústria, que parece estar próxima, esse legado deve ser levado em conta pelas concorrentes que ainda lutam pelo setor.