Quando chegaram pela primeira vez às lojas em 1996, Pokémon Red & Blue (ou Red & Green no Japão) fizeram o maior sucesso. Encantando crianças e adultos, os jogos de capturar, treinar e combater Pokémon e outros treinadores logo se tornaram uma febre em todo o mundo.

Hoje, quase 30 anos depois, Pokémon é a maior franquia de entretenimento do planeta e a Game Freak segue lançando novos títulos para os consoles da Nintendo, sendo os mais recentes Pokémon Scarlet & Violet para o Switch. E foi justamente o lançamento conturbado destes últimos que levantaram a bola para o questionamento: os jogos antigos de Pokémon eram melhores?

Pokémon era melhor no passado?

A resposta para tal questionamento é um tanto complexa. Os jogos dos monstrinhos de bolso eram mesmo melhores antigamente? E por que eles pareciam durar mais tempo? Antes de começar a responder, precisamos nos despir da nostalgia e saudosismo e tentar observar tudo com maior objetividade.

Dito isto, vamos analisar a situação. Lá atrás, quase três décadas no passado, ainda na era do querido Game Boy, Pokémon era novidade. O game trazia 150 monstrinhos, entre formas iniciais e suas evoluções, passando por criaturas lendárias, e você podia ter todas elas na sua coleção para completar a Pokédex.

Quase 3 décadas atrás fãs encontravam pela primeira vez o Pikachu, monstrinho de bolso que se tornaria o mascote oficial da franquia.
Quase 3 décadas atrás fãs encontravam pela primeira vez o Pikachu, monstrinho de bolso que se tornaria o mascote oficial da franquia.

Para isto, porém, era necessário utilizar uma das maiores sacadas da franquia, que segue firme até hoje mesmo nos lançamentos mais recentes: em vez de todos os 150 monstros estarem no cartucho, alguns eram exclusivos de uma versão ou de outra, fazendo com que jogadores precisassem trocar monstrinhos com amigos e até mesmo desconhecidos por meio do cabo Game Link.

Este aspecto social tornou o jogo ainda mais popular, já que além de trocar criaturas era possível combater outros jogadores, cada um com seu time e estratégias distintas. Desta forma, novas amizades eram forjadas e fãs se reuniam em grupos para realizar torneios e até mesmo simular os ginásios da Liga Pokémon e a Elite dos Quatro na vida real.

Ainda que este tipo de interação ainda exista hoje em dia, por conta da internet houve uma perda significante no que diz respeito à experiência presencial. Afinal, é mais fácil trocar e lutar online do que sair de casa para encontrar outros jogadores, certo?

Nos games mais antigos era necessário ter um cabo Game Link para trocar Pokémon com a galera.
Nos games mais antigos era necessário ter um cabo Game Link para trocar Pokémon com a galera.

Outro ponto que não podemos deixar de abordar é a forma como a história era desenvolvida. Por ser bem mais linear, era mais fácil contar uma história coesa com início, meio e fim, que ia se desenrolando aos pouquinhos enquanto o jogador avançava na trama.

Cada novo ginásio vencido nos deixava mais próximos de desvendar seja lá qual fosse o mistério da história; cada nova habilidade aprendida permitia alcançar áreas antes inalcançáveis e encontrar novos monstros e personagens. Essa linearidade possibilitava aos desenvolvedores criarem tramas mais complexas, que eram trabalhadas lentamente rumo ao desfecho no final do game.

Até mesmo os times adversários, como a lendária Equipe Rocket por exemplo, pareciam ter planos muito mais interessantes e ambiciosos. Isto é algo que foi se perdendo ao longo das novas iterações lançadas posteriormente, culminando nos últimos games para o Nintendo Switch.

Atenção aos detalhes

Muito se fala sobre como os jogos hoje em dia pegam na mão do jogador como uma babá, praticamente jogando em seu lugar. São muitos tutoriais, muitas instruções na tela, muitos marcadores mostrando exatamente o caminho a ser seguido. Não tínhamos isto quando os primeiros Pokémon foram lançados, mas os lançamentos mais recentes parecem estar cada vez mais seguindo esta tendência de mercado.

Games mais recentes como Sword & Shield são bem lineares e repletos de informações auxiliando jogadores.
Games mais recentes como Sword & Shield são bem lineares e repletos de informações auxiliando jogadores.

Por exemplo, em games mais antigos da franquia era bem comum entrar em praticamente todo e qualquer prédio ou casa, falar com os NPCs e ler todo tipo de diálogo, dos mais inúteis aos mais divertidos e até mesmo informativos. Falar com um personagem era sempre legal porque você não sabia se sairia dali com um uma informação importante ou apenas um comentário desnecessário.

Em Pokémon Scarlet & Violet isto já não acontece mais. Nos novos games, a imensa maioria das construções são bloqueadas: você não entra em casas, prédios, apartamentos e por aí vai. Nem mesmo as lojas funcionam como antigamente, você simplesmente acessa uma tela de menu e escolhe o comprar.

Todas as lojas em Pokémon Scarlet & Violet se resumem a menus.
Todas as lojas em Pokémon Scarlet & Violet se resumem a menus.

Já os diálogos, bem, aqui a diferença é gritante. Os jogos agora mostram diferentes tipos de balões de fala para diálogos “comuns” ou para os que vão levar a uma batalha, troca ou missão. Saber de antemão que um NPC não vai te falar nada de “útil”, além de reduzir bastante o tempo de jogo e exploração em busca de novas pessoas para conversar, também tira a surpresa do teor de determinadas interações.

Pokémon agora te diz o que vale ou não à pena ler. E isto é invariavelmente ruim, porque tira muito da experiência entregue em títulos anteriores. Mesmo com NPCs caminhando pelas ruas e monstrinhos correndo para lá e para cá, o mundo do jogo se torna muito menos vivo e mais desinteressante, além de reduzir drasticamente o tempo de exploração e, consequentemente, de jogo.

O começo do declínio

Obviamente, os primeiros jogos se beneficiaram por serem uma tremenda novidade, além de fatores como o difícil acesso à internet. Na época, jogadores dependiam de amigos com mais conhecimento, de revistas sobre o tema ou de — acredite — centrais telefônicas especializadas em fornecer ajuda sobre diferentes jogos. A experiência de jogo na década de 1990 era bem diferente da de hoje em dia.

Mas os problemas da série Pokémon não começaram agora. Conforme a tecnologia foi avançando e novos portáteis foram sendo lançados, a franquia dos monstrinhos de bolso foi buscando formas de acompanhar essa evolução e entregar novidades aos fãs. Entraram em cena, por exemplo, as batalhas com sprites em movimento em Pokémon Black & White, bem como a estética 3D com câmera fixa na era do Nintendo 3DS.

Essas novidades foram muito bem vindas e mostravam que a franquia buscava sim inovar, mas todas elas vinham ao custo de quedas na taxa de quadros por segundo, problemas de performance e por aí vai. Jogar Pokémon Ultra Sun & Ultra Moon no 3DS com o tanto de lentidão quando certos golpes eram utilizados foi uma tarefa bem desgostosa, por mais que os jogos sejam muito bonitos e a aventura em si seja bastante interessante.

Quem sabe possamos traçar uma linha do começo do declínio de Pokémon quando foi decidido que a série migraria de vez para um formato 3D? Talvez. Afinal, embora antes não fossem nem de longe jogos perfeitos, a coisa parece ter começado a desandar quando a Game Freak apostou em algo que parecia fugir do seu domínio: a criação de grandes mundos em três dimensões.

Pokémon Scarlet e Violet são ruins?

Se o problema, segundo o que falamos até aqui, foi migrar para o 3D, isto significa então que Pokémon X & Y, Omega Ruby & Alpha Sapphire, Sun & Mun, Ultra Sun & Ultra Moon, Sword & Shield, Legends Arceus e Scarlet & Violet são todos ruins? É claro que não.

Cada um destes jogos tem seus méritos e, por mais que tenham também as suas falhas, continuam cativando jogadores em todo o mundo vez após vez mesmo trazendo basicamente a mesma fórmula criada em 1996. Acontece que, ainda que pouco mude no que diz respeito ao coração da franquia, cada novo game trouxe novidades que seriam ou não aproveitadas nos títulos seguintes, fazendo com que, assim como os monstrinhos, a série também evoluísse.

Um grande exemplo disso são os próprios Scarlet & Violet. Embora tenham sofrido e muito no lançamento, a proposta dos jogos fugiu bastante do que até então era tido como o padrão para jogos da série Pokémon. Aqui temos um mundo aberto com criaturinhas correndo livremente pelos campos, podemos explorar o mapa livremente por terra, mar e até mesmo ar.

Novas mecânicas, muitas vezes “reaproveitadas” de games anteriores ou repaginadas, como as batalhas em tempo real, também fizeram com que os games tivessem identidade própria e deixassem uma marca muito mais forte do que, digamos, Sword & Shield. Scarlet & Violet definitivamente foram mais um passo da Game Freak na direção correta.

Deixando a desejar?

Mas nem por isso devemos ignorar os problemas dos games mais recentes lançados para o Nintendo Switch. Quando chegaram às lojas cheios de bugs, com gráficos fracos, exploração das cidades extremamente limitada e campo de visão irrisório, obviamente Scarlet & Violet foram massacrados pelo público. E com razão.

Exceto por aqueles que, por algum motivo, defendiam que esta iteração da série deveria ter sido lançada para o sucessor do Switch. Ora, estas pessoas provavelmente não jogaram The Legend of Zelda: Breath of the Wild ou qualquer game da série Xenoblade, não é? O problema nunca foi o hardware do console híbrido da Nintendo, mas sim a inexperiência da Game Freak com jogos deste escopo.

Fossem os jogos belíssimos, tão bonitos quando o Zelda de 2017 (que, lembremos, era originalmente um game do Wii U), talvez o resultado fosse outro. Ainda teríamos comentários negativos acerca da falta de vilões reais, da falsa liberdade de exploração e por aí vai. Mas as críticas possivelmente seriam muito mais brandas do que as sofridas em novembro de 2022.

Futuro esperançoso

Mesmo com os gráficos fraquíssimos, os inúmeros bugs, a linearidade mascarada e tantos outros problemas, Scarlet & Violet ainda conseguiram de alguma forma dar uma guinada bem no finalzinho e entregar uma das experiências mais legais em jogos da série: a Área Zero. A pegada “Tales of” e “Persona“, com os personagens conversando durante a exploração, o visual lindíssimo, a trilha sonora de arrepiar os pelos da nuca… Ali a Game Freak mostrou que não está para brincadeira.

Por mais que ainda lhes falte o domínio do hardware e de jogos 3D em mundo aberto para consoles de mesa, ficou claro que há bastante potencial a ser explorado. O que nos resta é torcer para que alguns destes problemas não se repitam em Pokémon Legends Z-A, que deve chegar ao Nintendo Switch em 2025.

A nós, jogadores e fãs, só resta torcer pelo melhor.

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