Matéria introduzida há menos de dez anos nos currículos escolares brasileiros, a mecânica quântica (área da física que estuda o comportamento de partículas muito pequenas) divide todas as partículas elementares que constroem o universo em apenas dois tipos: férmions e bósons. Os dois apresentam propriedades fundamentalmente opostas.
Os férmions obedecem ao chamado Princípio de Exclusão de Pauli, que estabelece que duas partículas idênticas não podem ocupar o mesmo estado quântico ao mesmo tempo. Já os bósons não têm essa restrição, podendo compartilhar o mesmo estado quântico simultaneamente, permitindo fenômenos como o laser, onde muitos fótons podem estar no mesmo estado.
Porém, em um estudo recente, publicado na Nature, dois físicos da Universidade de Rice, nos EUA, mostraram a possibilidade teórica de um terceiro tipo no campo da matéria condensada. Esse avanço sugere a existência de partículas fundamentais ainda desconhecidas, embora, por enquanto, seja uma proposta baseada em modelos matemáticos
Além de férmions e bósons: em busca da partícula impossível
Mesmo sabendo que o princípio de exclusão de Pauli é responsável por toda a estrutura da tabela periódica, vários pesquisadores continuam utilizando modelos matemáticos para ver se surgem novas categorias de partículas ou comportamentos. Operando em um campo chamado paraestatística, eles procuram responder a algumas questões fundamentais: só existem mesmo férmions e bósons, ou há outras partículas que ainda não foram detectadas?
Embora os estudos matemáticos tenham revelado que a maioria das parapartículas observadas eram, na verdade, somente bósons ou férmions “disfarçados”, houve uma exceção. Os ânions, um tipo exótico de partículas restrito a apenas duas dimensões, poderiam ser o material procurado para quebrar as leis estatísticas esperadas dos férmions e bósons.
No entanto, os ânions não chegam a representar um tipo de partícula fundamental genuína ainda não descoberta, simplesmente por não poderem se estender para o espaço tridimensional do nosso Universo. Eles são apenas uma manifestação de interações complexas em sistemas 2D, como em líquidos de elétrons ou sistemas de partículas fortes.
Usando partículas para descrever materiais
Para testar suas novas hipóteses sobre uma possível terceira partícula, os autores Wang Zhiyuan e Kaden Hazzard usaram várias ferramentas matemáticas, como a teoria de grupos e a chamada equação de Yang-Baxter, que descreve como as partículas se reorganizam quando trocadas em interações.
Eles estudaram como excitações em materiais magnéticos, como ímãs, se comportam de maneira parecida com partículas. Elas parecem ter massa, carga ou outras propriedades, porém são quasi-partículas, ou seja, não são partículas elementares reais. “Partículas não são apenas essas coisas fundamentais”, explica Hazzard. “Elas também são importantes para descrever materiais”.
A dupla propôs, então, uma nova forma de quantização que permite que partículas exóticas (como os ânions) possam surgir em sistemas tridimensionais. Embora sejam tipicamente associadas a sistemas 2D, a experiência ampliou a compreensão sobre como comportamentos coletivos em materiais podem dar origem a novas partículas com propriedade exclusivas.
Implicações do novo estudo sobre a terceira partícula
Apesar de inovadores, os modelos não são capazes de mostrar o “mapa da mina” para uma nova classe de partículas. No entanto, representam um primeiro passo para a compreensão de inúmeros fenômenos físicos inéditos capazes de ocorrer em sistemas de parapartículas. Embora meio esquecida, a paraestatística mostrou-se capaz de detectar essas excitações coletivas em um sistema quântico.
Wang pondera que, “Para realizar parapartículas em experimentos, precisamos de propostas teóricas mais realistas”. Mas, uma eventual descoberta de novas partículas elementares e propriedades em materiais poderia revolucionar tecnologias quânticas, permitindo comunicações mais seguras e processamento de informações mais poderoso, com base nas propriedades quânticas dessas partículas.
Embora ainda no campo da especulação, o estudo não só revela algo concreto, no campo da matéria condensada em si, mas também apresenta novas possibilidades teóricas, abrindo um leque para a investigação de como as paraestatísticas (que descrevem parapartículas distintas dos bósons e férmions) podem ser aplicadas na prática.
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