Embora os especialistas considerem a arte rupestre presente em milhares de cavernas espalhadas pelo mundo como um sistema visual sofisticado, às vezes nos perguntamos por que aqueles registros filiformes parecem desenhos infantis. Agora, uma equipe de pesquisadores da Universidade de Tel Aviv propôs uma nova perspectiva: muitos desses registros podem ter sido efetivamente criados por crianças.

No estudo publicado na revista científica Ars, os autores afirmam: “Ao lado de muitas pinturas rupestres, há evidências claras da presença de crianças de até dois anos de idade. Até agora, a maioria das hipóteses se concentrou no aspecto educacional, aprendendo as tradições e costumes da comunidade”.

Mas, por que alguém levaria crianças para esses espaços profundos, escuros e com pouco oxigênio, muitas vezes escalando e rastejando sobre rochas úmidas e traiçoeiras? A hipótese é que essas crianças eram vistas como “agentes liminares”, capazes de se comunicar com o cosmos e entidades do mundo espiritual supostamente acessíveis na profundeza das cavernas.

O que é a arte rupestre?

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Arte rupestre em Carrícola, na Espanha. (Fonte: Getty Images/Reprodução)

Em um comunicado de imprensa, a primeira autora do artigo, Ella Assaf, explica que “A arte rupestre criada pelos primeiros humanos é um fenômeno fascinante que intriga muitos pesquisadores. Até o momento, cerca de 400 cavernas contendo arte rupestre foram descobertas, principalmente na França e na Espanha, com obras de arte datadas entre 40 mil e 12 mil anos atrás”.

Para ela a participação de crianças nessas obras de arte pode ser evidenciada, pela presença de impressões de pequenas mãos e pinturas a dedo feitas por menores de dois a doze anos. Segundo a coautora Yafit Kedar, embora a pesquisa sobre arte rupestre seja extensa, as referências à presença de crianças são escassas e restritas a propósitos educacionais.

No entanto, a participação dessas crianças não se limitava a uma educação artística, mas à “comunicação direta com entidades que residiam nas profundezas da terra e reinos sobrenaturais”, segundo o estudo. A ideia, disseminada em várias sociedades indígenas, é que esses pequenos conseguiriam “retornar ao reino sobrenatural mais facilmente do que os adultos”.

Qual a importância sobre a participação de crianças na arte pré-histórica?

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Pegadas de crianças da caverna Basura, na Itália. (Fonte: Prof. Marco Romano/Divulgação)

Para a dra. Assaf, a integração de dados sobre a participação infantil em pinturas rupestre permitiu uma explicação inovadora sobre essa prática comum em muitas sociedades antigas: “o mundo da infância difere do dos adultos, e as crianças possuem uma gama de características mentais e cognitivas únicas”, afirma a arqueóloga.

Pela sua pureza ou conexão com o reino que haviam deixado recentemente (antes do nascimento), as crianças funcionavam como mediadoras em cerimônias que buscavam harmonizar relações com divindades, ancestrais ou forças naturais. Por isso, essas pequenas marcas deixadas em cavernas podem estar associadas a ritos de passagem ou instâncias cosmológicas às quais meninos e meninas teriam um acesso privilegiado.

O coautor Ran Barkai pontua que, como muitas sociedades “consideravam as cavernas como portais para o submundo”, a pesquisa atual conecta a arte rupestre a cosmovisões ritualizadas complexas, nas quais humanos interagiam com entidades não humanas. Nesse sentido, a abordagem entre arqueologia e antropologia simbólica revela como sociedades antigas atribuíam funções específicas para seus membros de diferentes idades.

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