Arqueólogos finalmente descobriram a idade da “Criança de Lapedo”, esqueleto de grande importância para os estudos sobre a evolução da nossa espécie, por manter características dos neandertais após milhares de anos do desaparecimento deles. Conforme o estudo publicado recentemente na Science Advances, ela viveu entre 27.780 e 28.550 anos atrás.
Encontrada na região do vale do Lapedo em Portugal, em 1998, a ossada logo se transformou em uma das maiores evidências do cruzamento entre os nossos ancestrais e seus parentes humanos mais próximos. Até aquela época, acreditava-se que essa relação nunca havia acontecido.

Com aparência semelhante aos humanos modernos, os neandertais se diferenciavam por apresentar faces salientes, sobrancelhas proeminentes e costelas mais curtas, profundas e longas. Além disso, tinham órbitas oculares maiores e cérebro alongado, viviam em pequenos grupos e usavam ferramentas para caçar.
Eles foram extintos há cerca de 40 mil anos, possivelmente por fatores como mudanças climáticas, doenças e a própria competição com os humanos modernos. E como sugere o estudo, neandertais e Homo sapiens mantiveram relações sexuais de maneira mais frequente do que se supunha, pois a criança do Lapedo viveu bem depois do desaparecimento dos primeiros.
Como foi feita a datação da criança de Lapedo?

Desde o final da década de 1990, foram feitas pelo menos quatro tentativas de datar a “criança híbrida”, como os restos mortais também ficaram conhecidos. Porém, todas elas falharam em fornecer números mais precisos, por causa da degradação dos ossos e outros fatores.
Para resolver o problema, os pesquisadores investiram em uma técnica mais avançada para determinar a idade dos ossos. Extraindo um aminoácido chamado hidroxiprolina do rádio direito, eles conseguiram medir a taxa de decaimento de radiocarbono neste componente do colágeno, processo ideal para avaliar materiais degradados.
Foi assim que a equipe descobriu que os ossos da criança do Lapedo têm entre 27 mil e 28 mil anos. Enquanto isso, testes convencionais de datação por radiocarbono realizados anteriormente apenas sugeriram que o material tinha uma idade de aproximadamente 30 mil anos.
“Ser capaz de datar a criança com sucesso foi como devolver-lhe um pequeno pedaço da sua história, o que é um enorme privilégio”, celebrou a geoquímica da Universidade de Miami (Estados Unidos), Bethan Linscott, em entrevista à Associated Press. Ela é uma das coautoras do estudo.
Resolvendo mistérios sobre o funeral da criança

Ainda durante a pesquisa, os cientistas solucionaram alguns mistérios sobre o funeral da criança com traços de neandertais e humanos. Usando a mesma técnica, eles investigaram outros materiais que estavam no local, como carvão, ossos de um cervo vermelho e restos de um coelho.
Os dois primeiros eram bem mais velhos do que a criança e estavam na área muito antes do enterro, provavelmente não tendo sido utilizados no ritual. Já os ossos do coelho foram espalhados ao redor do esqueleto e apresentam as mesmas manchas avermelhadas dele, além de idade semelhante.
De acordo com o estudo, isso significa que o animal foi usado em algum tipo de oferenda funerária, tendo sido colocado na sepultura ao mesmo tempo que a criança. As manchas são resultado de uma mortalha tingida de vermelho que cobria o corpo.
Acredita-se que os restos mortais pertenciam a um menino vitimado por uma doença, queda ou afogamento. Outro detalhe é que o local onde ele foi encontrado funcionou como área de abate e processamento de animais por centenas de anos, mas acabou abandonado por aproximadamente 2 mil anos após o enterro da criança.
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