Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.
Passado o Carnaval e com aquela sensação de que agora o ano começou de verdade, voltamos às metas. Metas são importantes para direcionar nossos esforços, mas o que, de fato, as impulsiona? Motivação? Força de vontade?
“O segredo da força está na vontade” foi o que li em uma placa dentro de uma academia. A partir daquilo refleti: Será? Tirar força de alguma vontade que temos é o caminho? Qual o papel dessa variável em nossas decisões? Ao mergulhar na ciência sobre o tema, descobri algumas coisas interessantes e venho aqui compartilhá-las com você.
Força de vontade é autocontrole
Na ciência não chamamos de força de vontade, mas sim de autocontrole. Considero que é um termo melhor para descrever o conceito que é a capacidade individual de intencionalmente e de forma ativa alterar nossos próprios comportamentos, pensamentos, emoções e desejos.
“O autocontrole é uma forma de controle inibitório, um domínio dentro de nossa função executiva.”
E como exigimos do nosso autocontrole no mundo moderno, não acha? A todo instante temos que resistir às tentações imediatas: comidas hiperpalatáveis não saudáveis, entretenimento vulgar nas telas como celular e TV, além de diversos tipos de conforto, para podermos fazer outras atividades para nosso crescimento pessoal e profissional.
Tarefas que requerem atenção, emoção, cognição, impulso, escolha e persistência, exigem nosso autocontrole. Geralmente, superestimamos essa capacidade, acreditando que nosso “eu do futuro” irá conseguir resistir as tentações e superar as barreiras para o que acreditamos ser o melhor a fazer no momento. Mas frequentemente, sucumbimos.
Gastamos a força de vontade?
Nossa rotina está repleta de decisões sobre como vamos nos vestir, o que comer, como fazer as coisas, entre outras, exigindo muito autocontrole. O fato é que gastamos nosso autocontrole ao tomar decisões, o que chamamos de depleção do ego. É como uma fadiga mental em que a capacidade fica piorada para as próximas situações naquele dia.

Parecido com um músculo que se cansa, o autocontrole se esgota temporariamente. O estresse piora tudo, pois diminui ainda mais nossa limitada capacidade de se autocontrolar.
O autocontrole varia entre as pessoas, sendo alguns possuidores de maior controle de si e outros menos – o que caracteriza o autocontrole traço. Ao mesmo tempo que em situações diferentes, pessoas apresentam diferentes níveis de autocontrole, o que caracteriza o autocontrole estado. Alguns podem ser melhores em se controlar na alimentação, outros para levantar do sofá e praticar exercícios.
Exercícios e força de vontade
Existe uma relação bidirecional entre autocontrole e exercício físico, pois maior autocontrole permite mais exercícios físicos, bem como esses geram efeitos positivos sobre a função executiva, sendo o autocontrole um dos domínios dessa importante variável de nossa cognição.
Dominika Kwasnicka – pesquisadora sobre mudança de comportamento da Universidade de Melbourne, destaca características importantes para a efetividade do autocontrole, como traços de personalidade, quão motivada a pessoa está, quão importante determinado comportamento é para a pessoa no momento, e o quão bom é o sistema de suporte social próximo da pessoa e o ambiente em geral facilitando o comportamento. Mas Dominika ressalta: nunca é somente sobre força de vontade!
Aumente o seu autocontrole
Dentre as estratégias para manter ou aumentar a capacidade de alterar o comportamento estão: melhorar a motivação, formar intenções e relaxamento.
Ao aumentar a importância que damos aos resultados ou recompensas, podemos melhorar a qualidade da motivação.
Essa, em minha visão, é a principal estratégia a longo prazo para melhorar o autocontrole. Mas esse é um processo que pode demorar meses ou anos, no caso de se exercitar. Comece percebendo o que ganha com apenas uma sessão de exercícios: um up no seu humor, sensação de energia e clareza mental.

Uma medida prática para aumentar o autocontrole é adotar o planejamento. Se acontecer um imprevisto, você tem planos. A estratégia visa economizar o gasto de autocontrole, mas funciona melhor se formos específicos, como: “Se chover, troco minha corrida na rua pela esteira da academia, que está no caminho de casa, após o trabalho, às 19h”.
Se o autocontrole é como um músculo, descansar é preciso. O relaxamento é necessário para recuperação da capacidade e inclui meditação, mindfulness e Yoga.
Cuide do básico: alimentação, sono e exercícios
Cuidar da sua base biológica é fundamental, portanto, atenção para a qualidade do sono, da alimentação e do quanto move seu corpo. A psicóloga de Stanford Kelly McGonigal, em obra que se dedicou a entender a força de vontade, afirma que há uma epidemia de autocontrole fraco e foco ruim em nossa sociedade, graças a privação de sono, dieta ruim e estilo de vida sedentário. Ainda, o estresse é inimigo do autocontrole.
Uma maior consciência pode ser o primeiro passo para evitarmos gastar autocontrole durante o dia, mas não é suficiente. Nosso ambiente virtual e presencial é severamente construído para estar minado de tentações, pois sabemos das fragilidades humanas.
O fato é que não dá para confiar apenas na força de vontade ou autocontrole. Muito menos em quem diz que precisamos apenas de força de vontade.
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Fábio Dominski é doutor em Ciências do Movimento Humano e graduado em Educação Física pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). É Professor universitário e pesquisador do Laboratório de Psicologia do Esporte e do Exercício (LAPE/UDESC). Faz divulgação científica nas redes sociais e em podcast disponível no Spotify. Autor do livro Exercício Físico e Ciência – Fatos e Mitos.