A eletrificação dos automóveis de todo o planeta tem causado polêmica por diversos fatores, mas principalmente por fazer os fabricantes encerrarem a produção de modelos e/ou motores icônicos que fizeram legiões de fãs ao longo das décadas passadas.
Há casos, porém, onde problemas complexos são resolvidos com soluções criativas e até mesmo inusitadas. É o caso da Ford com seu Mustang Mach-E, um inédito SUV elétrico que carrega um nome repleto de tradição, mas que não tem absolutamente nada a ver com as raízes e a essência desse nome. Será que deu certo? Nós fomos descobrir para você.
Do multiverso para o planeta Terra
O TecMundo rodou por nada menos do que 2.000km ao longo da segunda quinzena de dezembro e, de cara, a ideia do primeiro e único (até agora) elétrico de passeio da Ford no Brasil é minimamente intrigante. Quem imaginou que um dia veríamos o nome Mustang atrelado a um SUV, naturalmente com pegada familiar, e ainda por cima elétrico?
O icônico esportivo americano completou 60 anos em 2024 e, desde os primórdios, trazia carroceria coupé com apenas duas portas e bancos na disposição 2+2 (dois assentos normais na frente + dois menores para crianças atrás). Já o SUV-coupé 100% elétrico lançado em 2019 joga tudo isso por água abaixo, mas por uma ótima razão que você verá mais abaixo.
Diferente do Mustang tradicional, fabricado exclusivamente em Flat Rock (EUA), o Mach-E é produzido em Cuautitlán, no México, além de Chongqing na China. Sua plataforma é a GE1, uma arquitetura baseada na C2 (do Bronco Sport e da picape Maverick, por exemplo) e que é utilizada unicamente por ele – ao menos por enquanto.
Ele foi lançado no Brasil em outubro de 2023 com apenas uma versão, a GT Performance, cujo preço é de R$486.000. Pouco antes do ano virar, a Ford introduziu a linha 2024 do Mach-E no mercado brasileiro com o mesmo preço de sempre e alterações mínimas na forma de novas rodas, faróis levemente redesenhados e uma nova opção de cor para a carroceria.
Cavalos (quase) indomáveis
A versão GT Performance é a mais poderosa do Mustang Mach-E. Ela traz dois motores, sendo um em cada eixo, capazes de entregar até 487cv e 87,7kgfm de potência e torque máximos. Esses números levam o SUV elétrico de 0 a 100km/h em 3,7 segundos e a uma velocidade máxima limitada eletronicamente em 200km/h por questões de autonomia.
E já que tocamos nesse assunto, todo o conjunto do Mach-E é alimentado por uma bateria de 100kWh que garante até 379km de autonomia segundo o ciclo PBEV, do Inmetro. No nosso uso, constatamos cerca de 420km de autonomia máxima com uso ininterrupto do ar condicionado, sem one pedal e quatro pessoas a bordo. Seu peso total é de 2.268kg.
Em matéria de tecnologia embarcada, o Mach-E traz itens como: faróis Full LED adaptativos com função Matrix, 9 airbags, bancos dianteiros com ajustes elétricos (duas memórias para o do motorista) e aquecimento, teto panorâmico, sensores dianteiros e traseiros de estacionamento, câmeras em 360º, multimídia vertical de 15″, entre muitos outros.
Além disso, quase todos os recursos semiautônomos de segurança estão presentes. Há piloto automático adaptativo, assistente de permanência em faixa, monitoramento de pontos cegos e de tráfego cruzado na traseira, frenagem autônoma de emergência, assistente de manobras evasivas, monitor de atenção do motorista e de pressão dos pneus, entre outros.
Não faz barulho, mas faz rir…e chorar
Os 2.000km que percorremos com o Mach-E se alternaram por igual entre ruas e estradas, além de momentos de condução calma e empolgada. O motivo é óbvio: qualquer carro que ostente o nome Mustang precisa entregar diversão ao volante, especialmente quando não há um V8 borbulhando debaixo do capô – o que já faz muitos torcerem o nariz para ele.
Mas não se apresse em julgar o Mach-E, pois a questão não se resume a “andar muito” em linha reta. De fato, o SUV americano é capaz de realizar acelerações violentas que empurram os corpos contra os bancos e fazem os ocupantes gargalharem de entusiasmo e espanto pela brutalidade… ou chorarem de medo, ansiosos por um pedaço de terra firme.
A brincadeira continua interessante nas curvas, pois mesmo com tração integral, o Mach-E consegue “jogar de lado” e fazer derrapadas controladas, lembrando seu irmão mais velho. A suspensão MagneRide altera sua rigidez (assim como no VW ID.4) e os freios Brembo estão ali para garantir que nada saia do controle e assim o fazem com maestria.
Isso tudo deixa claro que o Mach-E GT Performance, apesar do corpo de SUV, é um esportivo. Mesmo dotado de suspensão magnética, seu comportamento geral é duro e não lida tão bem com os defeitos da pista; a situação se ameniza nos modos de condução Whisper (o mais leve) e Engage (o intermediário), mas a essência do Mach-E é a de um legítimo esportivo.
O que também agradou no Mach-E foi o desempenho dos faróis Matrix e a boa fluidez da central multimídia SYNC 4, além do sistema de som da Bang & Olufsen com 10 alto-falantes (sendo um subwoofer), tendo 4 deles dispostos no formato de soundbar pegando toda a extensão do painel principal. Mimos mais do que obrigatórios nessa faixa de preço.
Por outro lado, sentimos falta de uma 3ª zona de temperatura para o ar condicionado na traseira e é preciso tomar cuidado em certos quebra-molas (lombadas) para não bater o meio do carro. Ele traz carregador portátil, porém, o plug da outra ponta é no padrão industrial e exige a instalação de uma tomada desse tipo no local onde você pretender utilizá-lo.
No final das contas, nossa experiência com o Mustang Mach-E foi divertidíssima e convincente, mas o que mais agrada no SUV elétrico é o “crédito” que ele garante para que a Ford possa continuar a produzir o Mustang tradicional e seu icônico motor de oito cilindros. Mais uma vez, modernidade e tradição se unem para trabalhar juntas e fortalecer ambos os lados.
Enquanto a Dodge “matou” o Challenger como o conhecíamos e a Chevrolet fez o mesmo com o Camaro, a Ford segue presenteando o mundo automotivo com o mítico Mustang e, dentre outros fatores, é ao Mustang Mach-E que você deve agradecer por isso. Talvez as ideias mais absurdas não sejam, de fato, tão absurdas quando colocadas em prática…